sábado, 10 de março de 2012

Novo blog

sábado, 10 de março de 2012

Mudo de blog com a mesma facilidade que mudo de carreira. Então, o que eu escrevi fica aqui, registrado. Estou, agora, escrevendo no www.adrianorangel.com.br/blog

O meu rastro na internet está aqui: www.adrianorangel.com.br


segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

A semelhança entre natal e ervilhas

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010
Dentre as diversas coisas que detesto, duas me dão vontade de matar: ervilha e natal. Tenho nojo de ervilha. Esse legume só teve alguma utilidade para as leis de Mendel. Hoje, serve apenas para contaminar risotos, saladas e, principalmente, empadas. Tamanha repugnância teve papel decisivo nas minhas habilidades motoras. Separo ervilhas como ninguém. Desenvolvi as mais variadas técnicas para segregar esse asqueroso grão verde da comida. Não tenho a mesma sorte com o natal. Tenho evitado topar com renas e papais noéis com a mesmo empenho que separo ervilhas. Diferente do natal, as ervilhas são previsíveis, povoam geralmente os mesmos pratos (risotos, saladas e empadas, como disse antes). Vez ou outra alguma ervilha errante pode ser encontrada no macarrão, no arroz branco. O natal, ao contrário, ocupa todos os lugares e objetos possíveis, mesmo os mais improváveis. Encontrar um papai noel num shopping center é tão certo quanto achar uma ervilha numa empada. A fatalidade acontece quando somos surpreendidos com uma ervilha no cachorro-quente ou com um papai noel morimbundo pedindo esmola no sinal. O natal contamina a cidade com um falso espírito de solidariedade, ao passo que as boas almas desperdiçam comida na farta ceia e embrulham para presente as mais diversas futilidades. A espuma branca simula a neve do inverno europeu em pleno verão tropical. A gente faminta ganha alguns trocados vestindo a fantasia gorda, vermelha e quente do papai noel, ouvindo sonhos roubados de crianças. O natal ilumina o antes escuro caminho com luzes coloridas, planta pinheiros ao lado de bananeiras. Eu insisto em separar o natal da minha vida, assim como o faço com as ervilhas. Contudo, sinto que nessa época do ano o prato de todos os dias é sopa enlatada de ervilha. Se sobrevivi à sopa verde servida na casa da minha primeira namorada,  no primeiro jantar com a sogra, talvez eu consiga suportar mais esse natal.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Cidade, o cinzeiro de nossas vidas

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010
É aquela velha história. Criam uma Lei Antifumo, torram uma grana em publicidade, contratam fiscais, armam todo o circo, mas o que não dá voto, visibilidade, fica de lado. Afinal de contas, numa cidade onde a rua foi substituída pelo shopping center, quem vai perceber a falta de lixeiras nas calçadas? Pois desde que a tal lei que proíbe o fumo em locais fechados entrou em vigor, a quantidade de bitucas jogadas nas ruas aumentou e muito. Se não bastasse a sujeira, toda aquela gente que frequentava os "fumódromos" dos prédios agora cospe fumaça bem na nossa cara, no meio da rua. Não tem um dia sequer que não tomo uma baforada ao ar livre. 
Não concordo com essa falsa conscientização que os maços de cigarro estampam na embalagem, com alertas sobre doenças e fotos de gente agonizando, brochando... Uma vez, na fila do caixa da padaria, vi um senhor resmungando ao pedir um maço de cigarro. "Troca esse maço aqui! No lugar da impotência sexual, dá o do ataque cardíaco, por favor". É claro que esse senhor fez piada da sua desgraça (pelo menos quero acreditar nisso), mas o fato é que colocar a culpa no consumidor é sempre mais fácil. O sujeito fuma desde os 13 anos e agora, com 60, demanda o serviço de saúde pública para tratar de um câncer no pulmão. Culpa do sujeito? Quem mandou fumar desde cedo, não atentar para os apelos do Ministério da Saúde, né? Pois é justamente esse o discurso do Estado e da sociedade para um grave problema de saúde pública que, infelizmente, não se restringe ao cigarro. Não quero em absoluto isentar as pessoas de culpa pelas suas escolhas. A questão é não isentar o Estado, que faz de conta que cuida do problema torrando grana com esse tipo de lei inócua ao invés de investir no bom senso (leia-se educação).
Disse tudo isso para voltar às bitucas jogadas na rua. A falta de lixeiras não é somente um mero descaso da Prefeitura ou falta de bom senso de quem joga lixo no chão. Trata-se de pensar no espaço público como tal. E isso não há lei que ensine a fazer. É hipócrita o discurso que referenda a Lei Antifumo como um instrumento de melhoria da saúde pública, fazendo as pessoas vigiarem umas às outras, ao passo que faltam políticas elementares de cuidado consigo mesmo e com o lugar em que vivemos. E não demora muito para os maços de cigarro ilustrarem uma rua alagada, com os dizeres: "as bitucas jogadas no chão podem entupir boeiros e causar enchentes". Tudo bem, então, se não houver lixeiras. Como está tudo bem também com gente fumando e que não irá encontrar hospitais para remediar a sua desgraça.

sábado, 27 de novembro de 2010

Um mês morando no busão

sábado, 27 de novembro de 2010
Eu, assim como a maioria dos que moram em São Paulo, perdi mais ou menos um mês do meu tempo no trânsito durante esse ano que está quase terminando. Pior do que o tempo perdido é escolher desperdiçá-lo em prol de usar o carro todos os dias. Definitivamente, apesar dos apuros do transporte público, esse não é o meu caso. Apesar disso, pago com o meu tempo pela insanidade dos que preferem acelerar a ler um livro durante os seus deslocamentos urbanos.
Não moro longe do trabalho, mas, mesmo assim, não consigo levar menos de uma hora para chegar. Poderia fazer o trajeto de 20 minutos (sem trânsito, ou seja, jamais) em 50, porém esmagado no 577T-Vila Gomes. Optei, então, por tomar dois ônibus e ir sentado, mesmo que isso me custe 20 minutos a mais. Afinal de contas, sempre achei um absurdo esse faz de conta da lei de trânsito, que multa quem não usa cinto de segurança no carro, mas fecha os olhos para as condições precárias do transporte público, com pessoas não apenas sem o cinto, mas viajando em pé. 
Viajar sentado ameniza, mas não resolve o meu problema. De qualquer jeito, tenho que acordar mais cedo, deixar de correr pela manhã, fazer promessas nunca cumpridas de abandonar de vez essa cidade, ouvir as notícias de sempre sobre os congestionamentos de São Paulo (com tanta coisa mais importante para ser noticiada). Já que os "motoristas" me obrigam a morar um mês no busão (e, em tempo, pagar um aluguel muito caro por isso, cerca de R$ 130 por mês!), procuro usar esse tempo da melhor maneira possível. Esses dias, fiz uma lista - no próprio busão, no caderninho de bolso que sempre me acompanha - de tudo o que carrego na mochila. Não ouso entrar no busão sem o meu Ipod. Pode parecer ridículo, mas isso me poupa ter que ouvir conversas alheias sobre "a fulana que deu para o namorado da sicrana" ou assistir o último capítulo da novela na TV Ônibus. Levo também livro, a revista National Geographic do mês, o já citado caderninho de bolso (para o caso de alguma ideia aleatória ou tentativa de desenho), estojo (com toda a sorte de lápis, canetas e armas brancas) e o meu recém adquirido smartphone (o mais fuleiro de todos), um verdadeiro canivete urbano, com internet, máquina fotográfica, rádio, jogos... Num dia de chuva, quando o trânsito trava de vez, começo a trabalhar dentro do busão mesmo, conectado ao email e ao MSN, Gtalk...
Embora o busão tenha cumprido, a contragosto, o papel da minha cadeira, da minha cama (sim, eu também costumo dormir no busão e, não sei como, acordar sem susto dois pontos antes ou, quando venho do bar, dois depois), da minha baia, da minha cozinha (sempre tem um biscoito na mochila), eu não me comporto como se, de fato, eu estivesse em casa, como fazem alguns. A pior invenção da humanidade, sem dúvida, foi esse celular com caixinha de som embutida. Se já não bastasse tamanha falta de noção, outras invenções apocalípticas se manifestam no tal aparelho, como pagode, sertanejo e funk carioca. Há também quem use o busão como sala de estar, falando alto pra caramba ao celular. Isso para não citar aqueles que, como um cara que conheci, comem marmita no busão! E quando o busão vira igreja, com fiéis tentando aumentar o seu rebanho? Afinal de contas, os tais "usuários" já estão tão acostumados com a privatização do espaço público que assistem pela janela do busão, que parecem não se incomodar com tamanha falta de bom senso. É como se eu estivesse num verdadeiro cortiço ambulante, pagando aluguel e tudo.

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Nota urbana: "apenas um bêbado deitado na calçada"

quarta-feira, 29 de setembro de 2010
"Ikeda, lembra de mim? Sou eu, o Osvaldo. Servimos no quartel juntos", diz o senhor com traços orientais, segurando forte a mão do outrora companheiro de combate que, nessa noite, depois de seis doses de vodka barata, foi encontrado estirado na calçada. O "apenas um bêbado", como foi rotulado por diversos transeuntes, é um senhor grisalho, oriental, com ar e vestes impecáveis e uma sacolinha na mão com três ou quatro maços de cigarro. Seria apenas mais um obstáculo humano na calçada da cidade se não fosse a generosidade das jornalistas Luciana Pioto e Estefani Medeiros, que, no caminho para o ponto de ônibus, encontraram Seu Ikeda deitado no chão, sozinho, de barriga para cima, com um dos braços sob a cabeça, na tentativa de um travesseiro, e as pernas cruzadas. Parecia estar confortável, com os olhos fechados e a respiração tranquila. O celular, jogado ao seu lado, guardava o número do amigo Osvaldo Sato, dentre muitos outros. O sobrenome oriental foi a pista que Luciana encontrou para achar alguém da família. "Osvaldo! Que porra de Osvaldo?! É o meu dentista, porra!", resmunga Seu Ikeda, numa das poucas palavras que proferiu. Em poucos minutos, Osvaldo chega, todo de branco, para reencontrar o colega que parecia não ver há muitos anos. 
Seria apenas mais um indivíduo deitado na calçada suja e escura da cidade, um louco qualquer, apenas um bêbado, mas bastou um gesto de solidariedade para encontrar o nome e a história de Seu Ikeda. Quantos outros nomes e histórias estão esquecidos nas ruas por conta da indiferença das pessoas, na cidade onde o outro parece ser apenas um obstáculo.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

DIA MUNDIAL SEM CARRO

quarta-feira, 22 de setembro de 2010
Em pleno Dia Mundial Sem Carro, a Avenida 23 de Maio viveu um dia como outro qualquer, de muito trânsito.
O Dia Mundial Sem Carro, data que incentiva o motorista a experimentar outros modos de transporte, foi comemorado com mais de 100 Km de filas nas ruas e avenidas de São Paulo. Como de costume, o transporte público saturado e a poluição do ar também se mostraram presentes. Afinal, porque a recusa das pessoas em deixar o carro em casa, nem que seja por um único dia? Há várias respostas para essa questão, mas eu vou preferir um outro caminho, o da circulação desnecessária.

“Experimente ir de bicicleta. Ajude a humanizar o trânsito”, diz o cartaz elaborado por ciclistas militantes, onde se pode ver a ilustração de um casal pedalando tranqüilamente, com flores na garupa e sem a companhia de carros ou ônibus. Esse talvez seja o sonho das cerca de 300 mil pessoas que utilizam a bicicleta como meio de transporte em São Paulo. Mas o número pífio de ciclovias – a capital possui pouco mais de 40 Km de vias exclusivas para bicicletas – e a grande quantidade de acidentes envolvendo ciclistas e pedestres evidenciam a cidade destinada, sobretudo, aos carros, não às pessoas. 

O paulistano perde 27 dias do ano no trânsito. A velocidade média de um carro na hora de pico em São Paulo é de 15km/h, ou, em outras palavras, apenas 1km/h mais rápido do que uma galinha. O Metrô de São Paulo transporta diariamente 2,4 milhões de pessoas, boa parte em condições insalubres. O mesmo pode-se dizer dos ônibus e trens metropolitanos. Os investimentos milionários em transporte não dão conta de atender a uma demanda cada vez maior de pessoas circulando pelo espaço. Mas será mesmo que todos esses deslocamentos são necessários? 

Humanizar o trânsito, para usar a expressão do cartaz mencionado no início do texto, é, ao meu ver, humanizar as distâncias que as pessoas têm que percorrer todos os dias na cidade. Não adianta submeter a população a pedalar dez, vinte quilômetros todos os dias rumo ao trabalho, especialmente no sítio urbano de São Paulo, com uma quantidade significativa de ladeiras no sentido periferia-centro. Trata-se, pois, de repensar a cidade, colocando a vida antes da circulação nas prioridades do planejamento urbano. Não é possível que 6 milhões de automóveis saiam às ruas, 2,4 milhões de pessoas embarquem no Metrô... É preciso aproximar moradia, trabalho e serviços. Só assim a bicicleta será viável para a maioria da população e, quem sabe, viadutos serão transformados em jardins suspensos. O Dia Mundial Sem Carro, então, daria lugar ao Dia Mundial Sem Deslocamento Desnecessário.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

VOTE NO CAVALETE

terça-feira, 7 de setembro de 2010
Se já não bastassem camelôs, carros, postes, lixo e buracos atrapalhando o caminho dos pedestres, agora, durante as eleições, as calçadas viraram o lugar dos cavaletes publicitários. A lei eleitoral permite a instalação dos cavaletes nas calçadas entre 6 horas e 22 horas, todos os dias da semana. O pouco espaço das calçadas é disputado por diversos candidatos, que buscam justamente os lugares mais movimentados da cidade para ilustrar rostos quase sempre sorridentes, acompanhados de uma série de números de fácil memorização. 
Quem parece não ter muitos motivos para sorrir são os pedestres, obrigados a conviver com as tais placas publicitárias no meio do caminho. As calçadas do centro da cidade, onde circulam diariamente milhares de pessoas, são as mais disputadas pelos candidatos. Faltam bancos para sentar, sobram placas publicitárias. Os cavaletes reforçam, ainda mais, o uso da rua como lugar apenas de passagem, de circulação da massa trabalhadora, negando o seu valor como espaço público de lazer e convivência. A mesma calçada negada aos mendigos, expulsos violentamente durante a madrugada pela prefeitura, é doada aos cavaletes que vendem rostos sorridentes.